segunda-feira, 12 de maio de 2014

Um brinde.

Passei por um hiato.
Voluntario. Sempre voluntario.
Não são todos?!
As palavras me vinham. Perfeitas. Fluídas. Insípidas. Virgens.
A Virgindade é tão cálida, quente, aconchegante. Não queria me livrar dessa. Voluntária. Minha.
Minha. De minha posse. Meu domínio.
Minha.
Quão saborosa é essa palavra, não?!
Minha. Quase posso senti-la na minha língua. Escorregadia, densa, pastosa.
O que é de nossa posse parece melhor simplesmente por isso. Por possuirmos.
Não queria desvirginar minhas palavras. Elas pareciam tão melhores sendo apenas minhas. Virgens ao olhar alheio. Ao julgamento. Ao perigo de serem de outrem.
Expeli-las parecia quase um sacrilégio ao calor que me acalentava o peito por te-las só pra mim. Eram as únicas que dependiam de mim, unicamente e exclusivamente de mim, para não serem mais minhas. A responsabilidade residia somente em mim. Esse risco não me apetecia em absolutamente nada. Era um amargor nada saboroso ou desejoso como o de um uísque.
E cá estou a saborear esse amargor, que engulo com o uísque que agora bebo, sem gelo e com um cigarro nos dedos.
Hoje foi um dia amargo. Melhor amargar tudo como se deve, completamente.
Hoje não me afasto da fumaça impregnante do cigarro. Hoje quero feder. Feder à álcool, à tabaco, à decepção.
Ao amargor, um brinde!
Vamos louvar o que é inevitável, vamos louvar ao que é inerente à vida e a amarga com maestria.
Decepção, um brinde à você, minha companheira de toda vida, cuja presença nao decepciona e cujo gosto aprendi apreciar e degustar.
Hoje andei pelas ruas a sua procura. Virei a cabeça a cada esquina, a cada sinal, a cada passo. Precisava, com uma urgência antes desconhecida, de degusta-la.
E agora a vejo chegar, na carruagem negra e reluzente que conduz com gloria, ao meu encontro e ao do meu uísque.
Obrigada, companheira, por comparecer quando outrem se recusava.

Vamos lá, puxe uma cadeira, sente-se, fique à vontade e banhe-se no amargo sorriso com que a recebo.

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