Acho que a espera é inerente à minha existência.
Parece que sempre existi nesse estado ininterrupto de esperar.
Esperar pelo outro, na saudade.
Esperar pelo o quê, na falta.
Esperar pelos dias ensolarados, na noite fria.
Esperar pela amizade, na traição.
Esperar pela compaixão, na indiferença.
Esperar pelo amor, na carência.
Esperar pelo amanhã, no hoje.
Esperar pela vida, no tédio.
Esperar esperançosamente pelo outrem que nunca veio e que a própria vida duvida que virá.
Esperar sem nunca ter sido esperada é só a vida sendo hipócrita mais uma vez.
intento
domingo, 19 de abril de 2015
quinta-feira, 11 de setembro de 2014
Tertú e o Lago
Texto realizado para composição do projeto final de Imagem Técnica I. Além do texto que segue, foram também realizadas intervenções urbanas nos viadutos da Av. Antônio Carlos e um registro audiovisual de todo o processo de produção. Projeto realizado em parceria com o artista DagShow Silva, também belorizontino.
Partamos do
principio de que toda realidade é subjetiva, maleável à nossa vontade, mutável,
e que, aplicando-se a força, a pressão, na medida certa e necessária, o mundo
se transforma, a vida emerge do caos que norteia nossos dias, e o futuro parece
reluzir com o sol da possibilidade. Imagine que todo o mundo, toda a nossa
realidade vivente, todos os nossos gozos e nossas dores, sejam um lago. Plano,
imóvel, pesado. A água não reluz a energia do sol, mas a traga sedenta com o
seu negrume líquido. Tertú, tem oito anos. Hoje ele não pôde ir à aula, seu pai
homem correto, honesto e trabalhador, acordou com dores no corpo e não pôde ir
trabalhar. A família de Tertú, assim como a maioria da população mundial,
depende exclusivamente do suor do trabalho para sobreviver, comer, se vestir. O
pai de Tertú trabalha como pintor de paredes. Ele pinta letreiros de lojas,
paredes de obras, faixas de amor, formatura e eleição. Acorda às 5 da manhã de
segunda à segunda, dá bom dia ao sol, toma seu café simples e modesto, passado
pela esposa mirrada e tímida, que olha a tudo e a todos com um medo tão
primitivo que parece ser algo nato dela e não herdado da vida. Tertú só
encontra com o pai doze horas depois de tê-lo visto sair pela porta durante o
amanhecer. Ele traz as roupas sujas, coloridas, o ombro caído e um esgar
cansado nos lábios. Tertú conhece bem o pai que o criou. Sabe das manias, dos
trejeitos, dos franzir de sobrancelhas, do coçar da garganta. Tertú adora o
cheiro de tinta que chega com o pai, lhe traz uma tranquilidade que ele só irá
reconhecer quando sentir, pela ultima vez, o cheiro de tinta e aguarrasa ao
caixão do pai baixar na terra com a infinitude da morte. Tertú não conseguira
ficar em casa com o pai deitado na cama, acamado, fraco, indefeso, com o cheiro
do ranço da cama de um doente. Tertú descobrirá também que foi aquela a
primeira vez que o horror passou pela sua mente. Seu pai estava doente, com
dores no corpo, precisava apenas de repouso, mas para Tertú que não encontrava
no ar o cheiro que sempre o reconfortava, que lhe dava chão, calor e amor,
aquilo era a morte. Ele, com seus olhos, inocentes e crus, quase podia ver o
contorno da morte na cortina puída que descia ao lado da cama do pai enfermo.
Se horrorizava com as nesgas de sol que passavam pelos seus rasgos e iluminavam
o rosto de seu pai com cautela, como se o céu ainda estivesse tímido em
levá-lo. Ao encontrar o pai na situação em que estava e a mãe com o horror
estampado em cada respiração e resfolego, Tertú saiu de casa de supetão,
decidido, perdido, e louco. Já se percebia nele toda a fúria da personalidade
sólida que viria a ter e que respaldaria seu caráter quando fosse o seu caixão
a ser baixado na terra. Andou sem rumo, confundindo o chão com as lágrimas e a
loucura com o sonho. Ele queria com toda a força que possuía no ímpeto dos seus
oito anos ser capaz de fazer alguma coisa, de mudar uma situação que lhe
parecia irreversível e inevitável. Ao seu pai restava a sorte, o destino, pois
os meios do qual o mundo é cheio, não eram acessíveis à eles, habitantes
limítrofes de uma sociedade à beira eterna da evolução. Tertú andou até sentir
o solo mudar debaixo de seus pés, a grama crescer e pinicar-lhe a panturrilha e
o sol raiar sobre sua cabeça. Ele sentou na primeira pedra que achou, enfiou a
cabeça entre os joelhos e deixou-se soluçar, pedir, orar, por qualquer coisa,
qualquer solução, qualquer impossível. Por que ELE não podia fazer nada? Ele
olhou para as mãos. Ele tinha mãos capazes, com cinco dedos inteiros, que brincavam
na terra, construíam fortalezas de pedrinhas e pintavam desastradamente a
parede externa da casa. Essas mãos sempre tão úteis e amadas por Tertú,
receberam de uma só dose todo a aversão e loucura que receberiam na vida. Elas
eram falhas e incapazes. Tertú não sabia pintar, nem trabalhar, só brincar! O
que seria dele e de sua acuada mae? Tertú apertou a terra do chão com toda a
força que possuía, a terra foi expulsa de reduto tão apertado e as unhas se
cravaram na carne. Ele chorou. De dor, de desespero, de incapacidade. Sentiu-se
doente, mas não como o pai. Sentiu-se doente de loucura, sentiu-se doente por
conter no peito de oito anos uma angústia atemporal. O céu estava lindo, azul.
Azul da cor dos olhos de sua mãe, límpido e puro. Mas forte, implacável e
decidido. Quando seu olhar baixou sobre a Terra, ele se encontrou sentado na
beira do lago que seu pai o levava, quando dava, para pescar piabas.
O lago parecia um
espelho verde-musgo. Nem mesmo uma brisa quebrava sua solidez. Tertú nunca vira
o lago assim, tão quieto e parado. Parece que havia pescado todas as piabas,
deixando o lago seco de vida e futuro. Tertú não gostava da superficie petrificada
que via. Seu interior e âmago estavam em tal rebuliço de revolta que ele queria
que o mundo encenasse sua dor. Queria que lágrimas de gelo caíssem do céu, que
a copa das árvores se destroçassem com o vento, que as montanhas tremessem e se
abrissem em abismos infinitos de magma e rocha, tal qual como o inferno.
Toda a sua loucura,
toda a sua dor, seu desespero, encontraram o ponto de escape na coisa mais
simplória da história do mundo, uma pedra. Tertú não hesitou, não respirou, se
decidira. Não consegui ver saída palpável para a situação de seu pai, já havia
confiado o destino à fé que sua mãe lhe educara a ter, a fé na qual os pobres,
os enfermos, os sofridos, os desesperançados, encontram forças para seguir em
frente com a vida cruel que levam.
Tertú sentiu o calor da pedra por apenas alguns segundos, enquanto seu corpo se
esticava para arremessá-la o mais longe de toda a sua loucura possível. A pedra
voou o mais longe que já havia voado pelas mãos de Tertú, mas não alcançou nem
2/3 daquela imensidão espelhada.
A pedra caiu na água
com ímpeto juvenil de uma criança de oito anos que ainda acredita na vida,
apesar de temer a morte, e que, na inocência cálida de não conhecer o mundo,
ainda confia no melhor, no futuro, e na força que existe numa simples pedra de
ondular a superfície de um imenso lago.
domingo, 6 de julho de 2014
Batom (incompleto e nao revisado)
Lisbela estava feliz
esta noite. Sua filha andrógena havia chegado à uma resolução: não iria se
aventurar na miséria da desolação na cidade
em que cursara faculdade por certo tempo. Lisbela, como toda mãe, odiava
com toda a força que possuía em sua alma calejada o marco da confusão sexual na
vida de sua filha. Rio Cordas. Ela sonhava com sombras e vultos percorrendo as
ruas daquela cidade deserta que tivera sua paz violentada pela fúria
universitária, becos que não existiam povoavam sua mente com a prostituição
chula de interior e tráfico dos mais peçonhentos entorpecentes, estes também
frutos da sua imaginação aterrorizada e da consciência pastosa e pesada que a
alimentava.
Sua filha, zelada,
amada, engomada, havia sido entregue de mala e cuia àquela cidade do pecado
pelas suas próprias mãos. Quando se lembrava da época de mais impasse da sua
vida, sentia o gosto de bile lhe queimar a língua e corroer os dentes. Ela
havia falhado. Como recompensa pela melhor das intenções, por ter sido uma mãe
passiva, subserviente, atenciosa, que havia investido na cria toda a força que
possuía, havia recebido em casa, uma filha cuspida por Sodoma, traumatizada,
violentada, drogada, em suma, desiludida com a própria existência.
Quando os dias, logo
depois os meses, foram se passando, Lisbela começou a se lembrar do cachorro
abandonado que vivia com eles. No natal de 2006, sua zelada filha havia pedido
um cachorro como presente. Lisbela detestava cachorros, gatos, coelhos, ratos,
papagaios, cobras, sapos, e todos os outros bichos que pudessem vir a ter algum
tipo de relação com humanos fora de suas gaiolas. Então, quando o
introspecto Sr. Pedro, seu marido e
provedor, surgiu, muito sorrateiramente, com o presente em questão trancado no
banheiro da relojoaria em que trabalhavam, sua amada filha já estava dando
choques, quase que literalmente, de tão elétrica sua alegria. Este, por sinal,
foi outro momento de impasse pelo qual passou e que, por sorte do acaso, não
falhou. Ela permitiu que o presente, então chamado Tex, ficasse.
O filhote era
desengonçado e abobado mas era o único que estava presente quando fazia o
almoço, lavava as vasilhas, as roupas, a casa. Ele e seu olhar sonso a
acompanhavam por todo o seu percurso de doméstica sem hesitação. Sim, ele dava
trabalho, Sr. Pedro e sua filha falharam em educá-lo, e ele agia como se toda a
casa fosse seu banheiro. Assim como ele a acompanhava nos cuidados da casa, ele
também a acompanhava no seu cuidado para com ele. Quando ela lavava toda a área
externa da casa, ele se abrigava em lugar seguro da agua, deitava
confortavelmente, e a observava com seu olhar parado.
Quando eles se
mudaram para um apartamento, Tex foi delegado à irmã de Lisbela, Soraia. Soraia
era a tia fanática da família. Quando ela amava, doava inteiramente sua força
vital para o que quer que amasse. Ela havia sido fiel temerária das principais
e maiores igrejas evangélicas, obreira fervorosa da primeira igreja católica a
ser construída na cidade, candidata implacável à uma cadeira da Câmara
Legislativa, e uma mãe completamente louca. Ela subia a cidade inteira, sempre
muito atarefada em cima dos seus sapatos de salto alto vermelhos envernizados,
fosse entregando evangelhos, santinhos cristãos e santinhos eleitoreiros, ou
simplesmente resolvendo um problema inexistente e urgentíssimo para algum de
seus filhos, ou para todos eles.
Lisbela não ouviu
mais falar em Tex - de quem até sentia falta naquele apartamento abafado e
silencioso - por um bom tempo, sua filha havia se esquecido dele há tempos
idos. Até que, o não-reconhecido companheiro, foi atropelado por um ônibus.
Soraia, sempre atarefada, havia esquecido a porta aberta ao sair e o
aventureiro e inexperiente caubói, escapou para a cacofonia das ruas. Lisbela
se preocupou de tal forma que não acreditou em si mesma quando se viu ligando,
por três semanas, uma vez por semana, para a irmã com quem mal conversava para
saber notícias.
Depois da ladainha
inicial entre uma conversa de duas irmãs que possuíam mais onze irmãos, Soraia
contou em detalhes o trabalho que o cachorro estava lhe dando. Ele,
aparentemente, havia voltado doido, segundo ela, do acidente. O cachorro que
tinha sido atropelado como quieto, parcimonioso e abobado, voltara como um
cachorro agitado, trabalhoso e incontrolável. Soraia estava deixando de exercer
sua função - fritadora de pastel - de extrema importância na barraquinha de
Santo Antônio para tentar cuidar do cachorro louco. Tex havia quebrado a pata
traseira direita, pelo menos era isso o que desconfiava Soraia que nem o havia
levado ao veterinário. Ele mancava, muito.
Lisbela passou
semanas muda quanto à preocupação pelo seu companheiro ferido. Uma preocupação
que só reconheceu quando sentiu o alívio de resolver o problema. Tex voltaria a
morar na casa que morara antes, com seu outro irmão Bernardo. Ele era um homem
sozinho, alcoólatra, arrependido de absolutamente todas as escolhas que tomara
na vida. Era casado por temporadas com mulheres várias. Sua casa parecia uma
hospedaria de mulheres infelizes com as próprias vidas que o usavam como uma
boia salva-vidas, uma nova chance, uma porta para um futuro melhor. Só que a
boia era furada, a chance era um trote e a porta não tinha portal, se
sustentava em pé com o próprio peso e, ao menor toque, pressão, sopro, caía.
Tex foi bem recebido por Marcilania, uma loira sulista com os olhos mais azuis
que o céu de Junho. Ela foi a temporada mais longa de todas. Ela era linda.
Tex se recuperou,
apesar de mancar pelo resto da vida quando correr. Ele era agora um cachorro
saudável, pulguento e feliz. Realmente feliz. Ele parecia saltitar e não andar.
Lisbela gostava de manter esse pensamento em mente quando o via correr, apesar de
sua filha sempre ter afirmado que era um efeito sádico proporcionado pela
fratura mal curada dele.
Lisbela havia
voltado pouco tempo depois de Tex para a casa na qual os dois se conheceram.
Desde que haviam morados todos juntos muitos anos se passaram. Ela viera
sozinha com o marido, a filha não mais desflorava - de maneira muito estranha,
diga-se de passagem - para os dozes anos, estava agora sendo tragada pela
podridão de Rio Cordas, e encontrara Tex ali, como sempre estivera, só que com
outro dono. Tex agora só estava presente quando requisitado. E, quando Lisbela
não se lembrava dele, ou seja, ninguém mais se lembrava - seu dono, assim como
a irmã, não era muito sociável com animais, e o marido e a filha eram
indiferentes ao velho -, surgiam poças de xixi exatamente no meio do portão que
o separavam da antiga família.
Lisbela sempre
pensava nele como no cachorro abandonado. Ele não havia sido efetivamente
abandonado, é claro. Era alimentado com a ração do gato da filha, e agraciado
com pedaços de pão esporádicos que ganhava de Lisbela, a cada quatro meses e
meio era recolhido em casa na hora do almoço e devolvido ao entardecer
completamente pelado e sem pulgas.
Tex parecia aquela
bola velha que ficava no quintal, vez ou outra, quando tomavam ciência dela,
quem quer que fosse, dava uma rebatida no muro e tentava uma embaixadinha. Tex
era aquela bola que estava sempre ali, invisível à mente ocupada, inconveniente
ao estranho medroso e companheiro à alma solitária.
Lisbela via em sua
filha o cachorro imaginário que vivia sem suas memórias e se recuperava do
atropelamento com ímpeto desmedido e sem direção. Rio Cordas havia cuspido em
sua casa a sua obra mais prima de todas, seu zelo, seu esforço, sua alma. E ela
se corroía em bile ao pensar que fora mestre-de-obras de todo o acontecido. Ela
não sabia o que tinha se passado com sua cria na cidade do pecado, mas seu
ácido arrependimento não necessitava de porques para queimar.
Ela estava sublime,
andando pela casa, conversando alegremente, pensava que, com o marido e a
filha, mas, na verdade, sozinha. E tentava não demonstrar em absoluto sua
alegria e animação com as noites de sono que teria pela frente com sua filha
debaixo do seu teto, em respeito à resolução que tomara por conta própria.
Sua filha, sempre
tão libertária e revoltosa, não iria mais viajar para a cidade do pecado.
Amanhã poderia ser segunda, Lisbela levantaria animada com os trabalhos
domésticos do dia e agraciaria Tex com um pedaço de pão velho.
Ela só se deitou
para dormir depois que a resolução havia sido completamente firmada pela
desolação da filha, estendeu o primeiro cobertor, branco com listras azuis, e
se deitou.
Chamou pela filha da
cama. E a pediu encarecidamente para que a cobrisse.
Quieta para que a
mãe não percebesse seu estado alterado e encarasse seu silêncio como pesar
pelos planos desfeitos, ela estendeu a segunda coberta, mais velha que ela
mesma e só retirada do armário em tempos gélidos.
- Quando eu morrer e estiver para ser enterrada, eu quero estar de batom... - comentou Lisbela, tentando fazer graça para a filha.
- Ah é? Qual cor? Vermelho, roxo, rosa? - riu a filha, essas tentativas da sua mãe eram tão absurdamente raras que arrancavam risos de alegria e não de graça.
- Rosa, bem clarinho. - respondeu ela, como se passasse um batom invisível nos lábios.
- Blush? Sombra? - desdenhou a outra.
- Não. Blush, não. Carrega demais. Quero só esse protetor que acabei de passar. Ele da um tom saudável pra pele. - respondeu ela, desencavando o protetor dos cobertores dobrados ao lado.
- Ah, sim, pode deixar. - comentou a filha, risonha, enquanto estendia a terceira coberta, super fina, surpreendentemente quente e dificílima de dobrar, por cima da mãe.
Ela estava há
algumas semanas sem pintar a raiz branca do cabelo que crescia implacavelmente
com o passar dos seus quarenta e nove anos. Seu cabelo, que levara uma vida
inteira para crescer até os ombros, exibia uma cor de ameixa cintilante e os
fios brancos brilhavam e reluziam como mechas de prata. Seu rosto inteiro havia
se iluminado com aquela ousadia que temia ser incoerente e não usual para sua
idade. Somente agora, após vinte e cinco anos, toda uma vida, gasta em devoção
à família, ela havia começado a tirar o tempo para ponderar sobre si mesma,
sobre o que sempre quis e o que conseguiu. Sua alma calejada falava através do
seu olhar sábio e acuado, leitoso pelos calos que sofrera; e através das rugas
que chegaram mansamente e já começavam a formar um finco permanente entre as
duas negras sobrancelhas de águia.
- E tem que tirar minhas cutículas! - enquanto a filha saía e apagava luz.
- Ah, sim, sem problemas. Não esquecerei nunca das suas cutículas! - desdenhou a filha enquanto entrava no próprio quarto e fechava a porta.
- Mas sem esmalte! Cutículas sem esmalte! - ela ouviu Lisbela gritar pela última fresta.
segunda-feira, 12 de maio de 2014
Um brinde.
Passei por um hiato.
Voluntario. Sempre voluntario.
Não são todos?!
As palavras me vinham. Perfeitas. Fluídas. Insípidas. Virgens.
A Virgindade é tão cálida, quente, aconchegante. Não queria me livrar dessa. Voluntária. Minha.
Minha. De minha posse. Meu domínio.
Minha.
Quão saborosa é essa palavra, não?!
Minha. Quase posso senti-la na minha língua. Escorregadia, densa, pastosa.
O que é de nossa posse parece melhor simplesmente por isso. Por possuirmos.
Não queria desvirginar minhas palavras. Elas pareciam tão melhores sendo apenas minhas. Virgens ao olhar alheio. Ao julgamento. Ao perigo de serem de outrem.
Expeli-las parecia quase um sacrilégio ao calor que me acalentava o peito por te-las só pra mim. Eram as únicas que dependiam de mim, unicamente e exclusivamente de mim, para não serem mais minhas. A responsabilidade residia somente em mim. Esse risco não me apetecia em absolutamente nada. Era um amargor nada saboroso ou desejoso como o de um uísque.
E cá estou a saborear esse amargor, que engulo com o uísque que agora bebo, sem gelo e com um cigarro nos dedos.
Hoje foi um dia amargo. Melhor amargar tudo como se deve, completamente.
Hoje não me afasto da fumaça impregnante do cigarro. Hoje quero feder. Feder à álcool, à tabaco, à decepção.
Ao amargor, um brinde!
Vamos louvar o que é inevitável, vamos louvar ao que é inerente à vida e a amarga com maestria.
Decepção, um brinde à você, minha companheira de toda vida, cuja presença nao decepciona e cujo gosto aprendi apreciar e degustar.
Hoje andei pelas ruas a sua procura. Virei a cabeça a cada esquina, a cada sinal, a cada passo. Precisava, com uma urgência antes desconhecida, de degusta-la.
E agora a vejo chegar, na carruagem negra e reluzente que conduz com gloria, ao meu encontro e ao do meu uísque.
Obrigada, companheira, por comparecer quando outrem se recusava.
Voluntario. Sempre voluntario.
Não são todos?!
As palavras me vinham. Perfeitas. Fluídas. Insípidas. Virgens.
A Virgindade é tão cálida, quente, aconchegante. Não queria me livrar dessa. Voluntária. Minha.
Minha. De minha posse. Meu domínio.
Minha.
Quão saborosa é essa palavra, não?!
Minha. Quase posso senti-la na minha língua. Escorregadia, densa, pastosa.
O que é de nossa posse parece melhor simplesmente por isso. Por possuirmos.
Não queria desvirginar minhas palavras. Elas pareciam tão melhores sendo apenas minhas. Virgens ao olhar alheio. Ao julgamento. Ao perigo de serem de outrem.
Expeli-las parecia quase um sacrilégio ao calor que me acalentava o peito por te-las só pra mim. Eram as únicas que dependiam de mim, unicamente e exclusivamente de mim, para não serem mais minhas. A responsabilidade residia somente em mim. Esse risco não me apetecia em absolutamente nada. Era um amargor nada saboroso ou desejoso como o de um uísque.
E cá estou a saborear esse amargor, que engulo com o uísque que agora bebo, sem gelo e com um cigarro nos dedos.
Hoje foi um dia amargo. Melhor amargar tudo como se deve, completamente.
Hoje não me afasto da fumaça impregnante do cigarro. Hoje quero feder. Feder à álcool, à tabaco, à decepção.
Ao amargor, um brinde!
Vamos louvar o que é inevitável, vamos louvar ao que é inerente à vida e a amarga com maestria.
Decepção, um brinde à você, minha companheira de toda vida, cuja presença nao decepciona e cujo gosto aprendi apreciar e degustar.
Hoje andei pelas ruas a sua procura. Virei a cabeça a cada esquina, a cada sinal, a cada passo. Precisava, com uma urgência antes desconhecida, de degusta-la.
E agora a vejo chegar, na carruagem negra e reluzente que conduz com gloria, ao meu encontro e ao do meu uísque.
Obrigada, companheira, por comparecer quando outrem se recusava.
Vamos lá, puxe uma
cadeira, sente-se, fique à vontade e banhe-se no amargo sorriso com que a
recebo.
domingo, 15 de dezembro de 2013
Perco-me em labirintos a procura de um assunto. Qualquer assunto.
Falaria de césares e párias, de montanhas e cachoeiras, de arte e de futilidades, discutira polêmicas sem nem ter opinião formada, leria artigos do que não concordo e escutaria bandas das quais não gosto.
Um especialista me tornaria sobre o que quer que quisesse conversar.
Só para sentir que, durante nossa pequena troca de palavras, sua atenção está em mim.
Falaria de césares e párias, de montanhas e cachoeiras, de arte e de futilidades, discutira polêmicas sem nem ter opinião formada, leria artigos do que não concordo e escutaria bandas das quais não gosto.
Um especialista me tornaria sobre o que quer que quisesse conversar.
Só para sentir que, durante nossa pequena troca de palavras, sua atenção está em mim.
quarta-feira, 11 de dezembro de 2013
Certa vez me apaixonei pelo impossível.
Sabe aquele impossível realmente impossível? Que mesmo depois de noites em claro, lágrimas vertidas, cartas reviradas, conselhos misturados e maços e maços de cigarros fumados não tinha se tornado menos impossível? Um impossível que não tem nem por onde começar a torná-lo possível? Um impossível por natureza, como um pássaro que nasce pássaro e não lhe é possível virar morcego?
Então, exatamente esse tipo de impossível que lhe revira a alma e a cama junto, que lhe ocupa a mente e a vida, que lhe cansa a vista e os dias, que lhe mata aos poucos e incessantemente.
Creio eu, tenra em minhas experiências, que o impossível é, por si só, apaixonante. Ora, sem amores impossíveis onde estaríamos agora? Em uma sociedade sem poetas, sem artistas, sem tragédias. Na qual não se sente a angústia que é não poder tocar a pele que tanto anseia, não sente a dor, quase tangível, de não poder beijar os lábios que tanto deseja.
Vivemos em um mundo imediatista. Tudo é para agora. Tudo. Paciência parece ser virtude dos tempos em que minha avó precisava andar 5 horas de carroça para ver seu pretendente, 5 horas que passaria suspirando e esperando ansiosamente.
Não existe mais aquele jogo da sedução, do conquistar, do se encantar. Não se brinca mais com os olhares, nem com os bilhetes. O galante, não mais galanteador, vai direto ao ponto. Aborda seu amor de modo direto, inquisitivo e imediato. É quase um "agora ou nunca" do amor, "ou vai ou racha".
Nesse mundo completamente deturpado de sentimentalismo, o impossível é exatamente aquilo que grita à alma. Que faz a diferença. Que dá um gostinho de quero mais aos momentos.
Você sorri involuntariamente quando troca um olhar com o impossível. Um novo sol parece nascer no seu dia quando tromba com o impossível no corredor. Você quase ri em júbilo quando escuta o impossível gargalhando deliciosamente. Você pega o ônibus errado só para sentar ao lado do impossível na volta pra casa.
Como não se apaixonar pelo impossível? Não sei. Creio eu que seja impossível.
Me é impossível sentir seus lábios espertos, me é impossível passar os dedos pelo seu cabelo misterioso, me é impossível sorver do perfume da sua própria pele, me é impossível saber o gosto do seu suor, me é impossível rir da sua nua timidez sob meu olhar perscrutador.
Você me é impossível. E por isso, talvez apenas por isso, me seja tão apaixonante.
Sabe aquele impossível realmente impossível? Que mesmo depois de noites em claro, lágrimas vertidas, cartas reviradas, conselhos misturados e maços e maços de cigarros fumados não tinha se tornado menos impossível? Um impossível que não tem nem por onde começar a torná-lo possível? Um impossível por natureza, como um pássaro que nasce pássaro e não lhe é possível virar morcego?
Então, exatamente esse tipo de impossível que lhe revira a alma e a cama junto, que lhe ocupa a mente e a vida, que lhe cansa a vista e os dias, que lhe mata aos poucos e incessantemente.
Creio eu, tenra em minhas experiências, que o impossível é, por si só, apaixonante. Ora, sem amores impossíveis onde estaríamos agora? Em uma sociedade sem poetas, sem artistas, sem tragédias. Na qual não se sente a angústia que é não poder tocar a pele que tanto anseia, não sente a dor, quase tangível, de não poder beijar os lábios que tanto deseja.
Vivemos em um mundo imediatista. Tudo é para agora. Tudo. Paciência parece ser virtude dos tempos em que minha avó precisava andar 5 horas de carroça para ver seu pretendente, 5 horas que passaria suspirando e esperando ansiosamente.
Não existe mais aquele jogo da sedução, do conquistar, do se encantar. Não se brinca mais com os olhares, nem com os bilhetes. O galante, não mais galanteador, vai direto ao ponto. Aborda seu amor de modo direto, inquisitivo e imediato. É quase um "agora ou nunca" do amor, "ou vai ou racha".
Nesse mundo completamente deturpado de sentimentalismo, o impossível é exatamente aquilo que grita à alma. Que faz a diferença. Que dá um gostinho de quero mais aos momentos.
Você sorri involuntariamente quando troca um olhar com o impossível. Um novo sol parece nascer no seu dia quando tromba com o impossível no corredor. Você quase ri em júbilo quando escuta o impossível gargalhando deliciosamente. Você pega o ônibus errado só para sentar ao lado do impossível na volta pra casa.
Como não se apaixonar pelo impossível? Não sei. Creio eu que seja impossível.
Me é impossível sentir seus lábios espertos, me é impossível passar os dedos pelo seu cabelo misterioso, me é impossível sorver do perfume da sua própria pele, me é impossível saber o gosto do seu suor, me é impossível rir da sua nua timidez sob meu olhar perscrutador.
Você me é impossível. E por isso, talvez apenas por isso, me seja tão apaixonante.
terça-feira, 10 de dezembro de 2013
Assinar:
Postagens (Atom)